A dor me devolveu a um estado fundamental, sem nenhum intermédio entre mim e mim mesmo. Vejo elefantes de pernas delgadas e compridas. Gavetas projetando-se de pernas retorcidas. Imagens que se distorcem pela própria condição de serem fumaça.
Será que fui realmente devolvido? Alguma vez já estive aqui? O território me parece familiar. Sinto o odor da chuva caindo e corroendo as formas que rapidamente se transformam em outras sem terem no entanto a mínima semelhança com a forma original.
Percorro um corredor. Passo incontáveis vezes por uma cortina de pérolas. Adoro a sensação do ruído que surge com o meu andar e a sensação delas tocando o meu corpo.
Algo me remete às minhas primeiras memórias. Lembranças na cor sépia. Um universo de pensamentos, espelhos quase sem ressonância com o que refletem. Não me sinto seguro em afirmar se já estive aqui. Jamais se deve confiar na memória.
Corro, corro e corro. A sensação de deixar tudo para trás torna-se momentaneamente anestesiante. Apenas uma falsa verdade. Todavia nesse momento não suportaria ir até a raiz das coisas. Exausto, transito por um mundo que a cada passo se faz meu simplesmente pela dúvida de poder ter sido. Perco a força que me sustenta no chão e me firo. Jorra sangue de meu dedo sujo de lama que se mistura com a chuva formando algo em uma cor nunca antes vista pelas minhas retinas.
Perco o folêgo. Tenho contato com algo sublime e que sempre me parecera com minha idéia sagrada de reveleção. Agora sinto algo novo. Totalmente novo. Posso estar seguro disso. Algo que saiu de mim, da minha dor e da minha confusão.
Dessa ferida posso contemplar o porque de uma outra dor. Muita mais velha e intensa. Dor que se alojou na minha vida como uma terceira perna, mas que de repente deixou de funcionar como tal. Desabei em mim mesmo. Voltei para esse estado de natureza.
Não não não. O brilho do que me é revelado cega-me. Sinto qual uma mariposa em volta de uma lâmpada, mas não admito me deixar morrer por essa luz. As coisas muito claras e nítidas sempre me escaparam. A escuridão foi minha guia, como a um menino vendado por não suportar olhar para algo que não fosse confortavelmente doloroso. Uma dor crônica que não chega a matar mas parasila.
Agora vi o mais fundo que jamais suportei. Não posso seguir nem recuar.
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